[sumário nível 1]

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A gestão da paisagem, uma experiência pioneira em São Paulo
Euler Sandeville, 1993
versão resumida da Dissertação A Herança da Paisagem. [SANDEVILLE JR., Euler. A Herança da Paisagem. Orientadora Miranda Martinelli Magnoli. São Paulo: Dissertação de Mestrado, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, 1993.]

Reconhecendo o potencial paisagístico, de uso, histórico e arquitetônico da área central e preocupados com sua situação caótica, causada pela desordem visual da publicidade, dificuldade de circulação de pedestres pelo acúmulo e má localização do mobiliário urbano, duplicação de muitos equipamentos, problemas de segurança urbana e deterioração dos edifícios e monumentos de valor histórico, técnicos de diversos órgãos da Prefeitura propuseram em 1989 um programa-piloto de ordenação da área central, que se denominou Eixo Sé-Arouche. Tratava-se da implantação de uma sistemática técnica e operacional, que permitisse sua extensão a toda a área central e demonstrasse sua viabilidade para a criação de programas similares em outras áreas da cidade.

Na abordagem deste trabalho a paisagem é um todo composto por muitos fragmentos "refundidos" de muitos modos, como uma unidade formada por situações heterogêneas de configuração e significação, reconhecendo que essas especificidades qualificam cada local dotando-o de potencialidades e significados próprios. A ação deveria, portanto, integrar as diversas competências, sem perder de vista as especificidades locais do espaço público, passíveis de muitas leituras e usos. Nessa integração, não se pode deixar de levar em conta a realidade administrativa e política, bem como as oportunidades ou impossibilidades que vão se colocando ao desenvolvimento do trabalho.

A melhoria das qualidades estéticas, de "suporte de memória" e de uso pela população é obtida basicamente por um projeto de gestão (técnica e conceitualmente subsidiado no conhecimento e interpretação dessas qualidades e potencialidades). Para isso foi necessário o compromisso de total integração dos órgãos públicos, criando as condições para a coordenação dos diversos setores que atuavam desarticuladamente. A participação da sociedade, de entidades de classe, associações de moradores e usuários, de proprietários, comerciantes e empresas, era tida como indispensável ao sucesso do projeto, criando-se os canais de comunicação entre a comunidade e a administração pública, estratégia que favoreceu alguns dos melhores resultados obtidos pelo trabalho.

É possível agrupar em quatro itens principais os objetivos perseguidos na implantação do Eixo:

1- Integrar e coordenar as ações dos diversos órgãos públicos no espaço público, criando uma instância administrativa capaz de coordenar todas as ações na área, propondo projetos, gerenciando as intervenções e participação de particulares e órgãos públicos, estabelecendo uma fiscalização sistemática e supervisionada da área de atuação referente a elementos publicitários, segurança dos edifícios, bancas e ambulantes e criando um fluxo administrativo que respondesse agilmente às questões de tramitação de processos, fiscalização, pequenas obras.

2- Possibilitar o acesso à memória social e ambiental expressa nos espaços públicos, edifícios, panorâmicas, visuais, da área central, marcos de orientação e identificação na paisagem urbana, valorizando positivamente a imagem do centro e da cidade de São Paulo para a população, através de programas específicos:

a. a revisão e elaboração de nova legislação de incentivos à restauração de edifícios de interesse, o que não chegou a ocorrer;

b. projetos de recuperação e valorização de obras escultóricas, sendo talvez o caso de maior importância o restauro e nova ambientação da escultura de Vlavianos no Largo do Arouche;

c. incentivo à recuperação de edifícios de interesse arquitetônico ou de ambientação, atingindo-se também resultados interessantes com iniciativas espontâneas de alguns proprietários; contatos para atrair investimentos privados para recuperação de espaços e monumentos públicos, como no caso do Viaduto do Chá.

3- Ordenação dos elementos presentes no espaço urbano como forma de valorizar o potencial de uso, oferecendo melhores condições de segurança, informação e fruição à população definindo-se alguns programas específicos:

a. racionalizar e relocar equipamentos e mobiliários urbanos, favorecendo a fluidez dos percursos, as condições de segurança e percepção dos elementos significativos da paisagem.

b. racionalizar e disciplinar os elementos publicitários que se acumulavam sobre as fachadas e espaços públicos, muitos apresentando problemas graves de segurança, levando em conta a identidade de cada logradouro e imóveis de interesse arquitetônico, o que nos conduziu à elaboração de legislação específica para cada trecho do Eixo, porém referenciadas em uma diretriz geral.

c. racionalizar e relocar pontos e terminais de ônibus, de táxi e de estacionamento, o que foi atingido no Arouche e em parte na República, e iniciado na Patriarca, uma das principais áreas de conflito nessa questão, onde visávamos uma recuperação mais radical, redefinindo inclusive a cobertura da Galeria Prestes Maia, resgatando a panorâmica em direção ao Vale do Anhangabaú.

d. Ordenar e disciplinar as apropriações do espaço público por camelôs, bancas de frutas e outros, visando a segurança dos usuários e mesmo a fruição da paisagem nos espaços de maior fluxo de pedestre. O resultado mais expressivo obtido na época foi na Rua São Bento.

4- Estabelecer procedimentos de manutenção e fiscalização sistemática e coordenada, no que se refere à manutenção e padronização de pisos, guias, bancas, lixeiras e outros elementos, levando em conta as unidades paisagísticas. Incluiu-se aqui a otimização da limpeza e manutenção de galerias de águas pluviais, limpeza urbana e pequenas obras. Objetivou-se dar uma manutenção adequada à vegetação existente e a revisão de projetos de plantio na área do Eixo, promovendo arborização de logradouros quando conveniente e reforma de canteiros.

O Decreto 29.851/91 formalizou o Eixo Sé-Arouche e o grupo que coordenou as ações dos diversos órgãos e programas. A área do projeto foi ampliada pelo Decreto 31.620/92, passando a se constituir numa mancha abrangente do Centro (figura 1). Escolhemos duas áreas estratégicas para iniciar o projeto: o Lgo do Arouche e a Vieira de Carvalho, onde havia uma Associação de Lojistas interessada na melhoria da qualidade daquele espaço como forma de salvaguardar seu comércio das pressões que chegavam até a Pça da República. Foram feitos os levantamentos e estudos, agendaram-se reuniões com os lojistas nas quais se discutiu a nova legislação de anúncios para o local. Foi racionalizada a presença de postes e placas de sinalização e suspensa a implantação de um terminal de ônibus que já se havia iniciado no Lgo do Arouche, comprometendo a qualidade daquele espaço.

No contato com o Corpo de Bombeiros verificou-se a urgência em intervir em ruas como a S. Bento e Direita, devido aos prejuízos materiais e provavelmente de vidas em caso de incêndio. Isso antecipou a implantação do programa nessas ruas, a situação, fora a Praça da Sé, que se nos afigurava como mais complexa e delicada do Eixo. Contava o trabalho com o resultado que já era expressivo na região do Arouche, para demonstrar sua exequibilidade e, em relativamente pouco tempo, muitos comerciantes vieram a se adequar ao programa, que começou a ser implantado também em outras ruas.

Manter o Centro não se resume a uma questão de recuperar o investimento ou torná-lo novamente possível, nem em criar uma nova grande praça - a "rótula central". Cuidar do Centro não é impedir novos projetos, mas avaliá-los numa instância que gerencie a sua introdução na cidade existente. É reconhecer seu valor, tornando-o mais acessível, investindo no seu significado materializado em estruturas ambientais, discernindo as intervenções necessárias em todas as escalas, do posteamento à escultura, da rua ao edifício, da memória à modernização, do transeunte aos usos particulares do espaço público, avaliando os impactos com autonomia e mediante debates; gerenciando, enfim, um patrimônio que não nos pertence. É, em última análise, extravasar esse cuidado para o restante da cidade, reconhecendo que o acúmulo da história confere ao lugar um sentido que vai além da percepção ou uso imediato, valorizando o sentido de ser proprietário de um bem comum, como um aspecto importante da construção do exercício da cidadania.



Este texto é uma revisão muito resumida do capítulo da Dissertação de Mestrado "A Herança da Paisagem", de Sandeville Jr., FAU.USP, 1994.



tatuar na pedra com coração e mistério
Foto de Euler Sandeville Jr., Euler Sandeville Jr., Pinturas rupestres, Fabião I, 2000.




uma proposta de Euler Sandeville Jr.
estudos em história da cultura, das artes e da paisagem:
representações, imaginário, práticas e poéticas


Desenho de Euler Sandeville, vista de Mogi do Pico do Urubu, detlhe.

Aprender entre outros, uns com os outros, para gerar ideias de ações melhores para o Século 21.
O mundo que ajudarmos a construir, sabendo disso ou não, é aquele em que viveremos.
O mundo não será diferente das atitudes que tomamos.





Animação de Euler Sandeville, provável 2001


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Foto de Euler Sandeville Jr., Folha, detalhe, 2009


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