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APRESENTAÇÃO E CONCEITUAÇÃO DO PROJETO
conceituação    cronos    geo    estrutura


BREVE ADVERTÊNCIA SOBRE PERÍODOS, E SOBRE A ORGANIZAÇÃO DA NAVEGAÇÃO NESTE SÍTIO
por Euler Sandeville Jr.
versão inicial 18/03/2016.
Última atualização: 06/03/2017.
Revisão importante em 25/02/2018, pequenas correções em 08/07/2018, revisão importante em 13/10/2019.


como citar:
SANDEVILLE JR., Euler. “Breve advertência sobre períodos, e sobre a organização da navegação neste sítio“. A Natureza e o Tempo (o Mundo), on line, São Paulo, 2016.


Ninguém no seu juízo pensaria que uma data, por mais relevante que seja na vida das pessoas ou das nações, por si mesma, demarcasse como uma linha de fronteira processos distintos da história. Da mesma forma as periodizações. No entanto, devemos reconhecer, são um recurso poderoso para criar significação no tempo. Por sua longa e continuada repetição passamos a organizar o conhecimento a partir de períodos que tendem assim a nos parecer naturais – renascimento, modernidade, etc. Mas não são. A história não foi assim, este é o modo como organizamos suas narrativas e a nossa compreensão.

Por vezes, esses períodos, repetidos desde cedo em nosso aprendizado do mundo e do tempo, acabam nos parecendo naturais, verdades. Ganham autonomia sobre aquilo a que se referem: nos dizem não só o que deve ser olhado e lembrado, e o que não deve ser olhado ou deve ser esquecido, mas também o como devem ser olhados esses objetos de lembrança, ou de esquecimento. Toda periodização é relativa ao que se pretende. As fronteiras no conhecimento permanecem campos em disputa, são espaços de transição, cuja amplitude depende da temática e do foco com que se observa, e da duração que se observa.

Além disso, os espaços e tempos de sobreposição, de transposição, de permanência e inovação, costumam ser mais relevantes do que os limites. Ainda assim, usualmente remetem, de algum modo, a períodos convencionais, mesmo que particularizados nos objetos estudados. Não deixam de evidenciar, desse modo, as contradições dos grandes períodos. São todos estes artifícios, quase artefatos, de construção da consciência moderna sobre o passado e o presente.

Observemos ainda um outro aspecto. Houve muitas outras formas de periodizar. As periodizações que nos são caras são muito distintas de outras formas de periodização, por exemplo, da “Antiguidade”. Aquelas tendem ao imanente, indicam fluxos ou dispensações, são cósmicas; as modernas são basicamente sociais (quando não materiais), cronológicas, sequenciando mais do que interpolando as narrativas, sejam evolucionistas, pensadas como macroestruturas ou campos da subjetividade. É necessário não esquecer que o tempo, como o acontecimento, não é naturalmente partido, é uma tendência humana fazê-lo para nos situarmos de modo significativo em nossas lembranças e experiência, nossa história pessoal e social.

Considere-se ainda um duplo desafio. Por um lado, a contextualização histórica de documentos, objetos, processos, eventos. Por outro lado, a reinvenção contínua de significados e de seleções (escolhas) que os tornam significativos para nós. A contextualização adequada de um documento é condição para que se evitem os chamados anacronismos, ou seja, ler com os olhos de hoje os significados de ontem. Mas é também a reinvenção do documento, ou seja, explicita a própria contradição do saber histórico.

Além disso, o documento não se esgota na adequada contextualização histórica de sua produção, pois pode ter continuado abrindo frentes de significação para além de seu tempo de constituição, que também precisam ser pesadas e permitem múltiplas abordagens distintas. A mera decisão de vê-lo como documento disso ou daquilo, o torna suporte de convicções e abre narrativas, aderentes ou não a esse sentido, que é assim, sempre, construção.

A organização adotada neste sítio – Aurora na Neblina, A Longa Antiguidade do Mundos, A Brevidade do Presente (se já não mudei esses títulos até o momento em que você lê aqui) – visa principalmente possibilitar a navegação por um material que ainda está sendo produzido. Mas não é apenas uma questão lógica. É também um convite a um olhar que seja também poético sobre a construção do nosso conhecimento, porque a construção de significados nos convida para além do prosaico, embrenhada de possibilidades existenciais que se insinuam, que nos escapam, que relacionamos. Embora a denominação adotada possa ter algo de original, não se trata de ideias, ou periodizações originais. Até porque não se pretende construir novo sistema d periodizações. O que é original é o emprego que aqui se faz desse arranjos, é a sensível construção de significação crítica assim proposta.

A datação e denominação dessas seções é dinâmica, sobretudo nas datas que organizam os subperíodos, pois estes visam em grande medida a organização do material de pesquisa à vista das intenções deste projeto. No entanto, ou justamente em decorrência disso, à medida que aprofundo os conhecimentos sobre os documentos e processos do passado, suas durações e espacialidades podem variar conforme amadurece o conteúdo de pesquisa e a intencionalidade narrativa. Era necessário tentar criar uma estrutura inicial baseada nessas seções, de modo a tornar possível a navegação por uma grande quantidade de informações que se vai acumulando.

Essa construção, a um tempo, rompe, dialoga e repropõe, de modo crítico, as divisões tradicionais da história, tão arraigadas em nossa forma de ver o mundo. Esta é também uma razão para adotá-las. Contudo, não se vê, nem se propõe, qualquer perspectiva explicativa em si mesmas. Por exemplo, a Antiguidade Clássica, que de fato, como a Renascença, não existe, não é uma explicação para nada, não é uma totalidade válida, mas não quer dizer que não tenha significados.

A consciência dos limites próprios do ensaio, e de todo o conhecimento humano, é o que se encarrega de evidenciar os limites entre o que gostaríamos que fosse possível e o que é possível nessa aventura de desbravar o mundo. Justamente por isso, enfrento a responsabilidade de problematizar os conteúdos da consciência da contemporaneidade e de sua memória social, constantemente posta em discussão e afirmação autoritativa, em disputa e des-re-construção de valores. Por outro lado, usufruo a liberdade de indagar a transversalidade dos eventos e formulações intelectuais, sem cair em um particularismo exacerbado, de modo a permitir estabelecer ensaios críticos, demarcando aprofundamentos e entrelaçamentos distintos entre o material visitado.

Dadas as restrições que fiz, sobretudo às divisões da história em períodos, e tendo julgado conveniente adotar uma distribuição dos conteúdos em seções que evidentemente questionam, mas dialogam inclusive de modo poético com essas divisões da história, vale uma observação, para deixar mais clara a divisão de seções deste sítio:


elas não têm valor explicativo, e portanto não são delimitativas dos fenômenos! São, para este projeto, insisto, apenas uma forma de me apropriar do conteúdo e problematizá-lo no contexto dos diálogos críticos pretendidos!

Por exemplo, a clássica carta de Petrarca, relatando sua escalada do Monte Ventoux (1336), estará acessível no período por ora definido como MUNDUS NOVUS. Aí também estarão o alargamento do mundo com as “grandes navegações” do quatrocentos e do início do quinhentos, e as revoluções na natureza operadas pela Reforma e pela ciência de Copérnico e Galileu. Mas a carta de Petrarca não está situada nesta seção porque seja vista como um prenúncio da modernidade da Renascença – e não penso que seja. Nem como um marco da contemplação da paisagem, como por vezes é entendida, uma vez que de modo algum é vista aqui dessas formas.

Esse período, MUNDUS NOVUS, na verdade é apenas uma seção deste sítio. Claro, decorre de uma longa reflexão, na qual se revelaram insuficientes as ideias de Baixa Idade Média e Renascença e, em especial, a cisão tantas vezes repetida entre elas. O que não quer dizer que não sejam portadoras de importantes significados, mas esta separação parecia-me encobrir, para as discussões que estabeleço aqui, condições importantes para esses tempos e, sobretudo, para o que se seguiu.

Como quaisquer outros, os períodos que possam estar contidos em MUNDUS NOVUS abrigam tanto uma grande renovação das ideias sobre a religião e dos contatos interculturais, quanto da base material de transformação social, bem como um novo olhar para a “Antiguidade”, ou seja, para o próprio tempo das pessoas e conjuntos sociais que os observavam. As grandes navegações descortinaram um mundo novo, distinto daquele observado por Petrarca. Também o fazem os telescópios que especulam os movimentos e a matéria dos astros. Apesar da distância entre a carta de Petrarca a Dionísio do Burgo Santo Sepulcro e a carta de Galileu a D. Benedetto Castelli, as formas culturais revelam também uma importante persistência transversal não estática - que se quis ignorar para se estabelecer outro projeto de sociedade e de valor -, pois se transformam no contexto dessas grandes mudanças.

O fato é que, sendo uma construção indagativa e crítica, e não uma explicação residente em si mesma dos conteúdos dessas épocas, esta escolha também poderia ter sido outra. Em vez de adotar uma seção Mundus Novus, por exemplo, poderíamos ter ficado com a instigante Longa Idade Média de Le Goff (que me parece muito mais consistente em muitos aspectos do que a de Renascença ou de Era Moderna).

Do mesmo modo, recusando as questões entre Antiguidade Oriental e Clássica, que têm suas razões no metier e na origem dessas histórias, optei por uma Longa Antiguidade dos Mundos, porque em parte não consigo entender essa segmentação entre história oriental e história clássica e, quanto mais estudo, mais sobressaem os intercâmbios. Em decorrência essa Longa Antiguidade não vê como uma questão a distinção entre Antiguidade Oriental, Clássica e Antiguidade Tardia, ou as difíceis fronteiras desta com a Alta Idade Média. Esses mundos abarcados aqui como uma longa Antiguidade não terminaram, embora não existam mais. Não existem, mas suas condições ou partes delas persistem. Daí, a Longa Antiguidade não se refere a uma suposta inatividade desses mundos, mas aos modos como nos alcançam e nos ativam.

No decorrer do projeto essa organização inicial também foi mudando, ora trazendo novos arranjos, ora demandando subdivisões para permitir organizar o material, que permanecem, ou tendem a permanecer, em um contínuo rearranjo. Até aqui são, reconheço, rígidas pelo recurso a alguma datação sempre arbitrária, mas são rígidas apenas como forma de organização do material a ser consultado, pois o pensamento flui continua e necessariamente entre elas.

Portanto, nem por essa recusa crítica no plano conceitual, nos furtaremos, pela sua facilidade comunicativa, a empregar essas configurações, sejam essas aqui propostas, sejam as tradicionais, para situar rapidamente determinadas questões, com tudo o que movimentam e acessam. Porém, não procuro dotá-las de valor explicativo que lhes seja inerente (é um recurso apenas locacional, não explicativo de grandes estruturas) e não vendo muito interesse na ideia (para mim anacrônica) de modo de produção ou de estilo, por exemplo, e talvez não reconhecendo mesmo o sentido dessas divisões tradicionais da história, as seções deste sítio acabam por serem, de fato, uma forma narrativa poética e crítica, comunicativa, que perpassa a concepção deste projeto.

Isso mostra que essas seções aqui propostas, se espelham uma visão crítica e expressem questionamentos, são apenas uma referência para organizar a navegação, aproveitando-se da facilidade comunicativa do que já é habitual. É necessário entender que todo passado são mundos que não existem mais, mas nos afetam direta e intensamente e muito desses mundos não só são transformados ao olharmos para eles, mas residem ativos em nosso contemporâneo que imagina tê-los superado em conhecimento e progresso. Nosso presente também é um mundo que não existe mais, não só porque nos escapa profundamente, dele retendo elementos selecionados e representações que nos interessam, mas porque este é muito mais amplo do que a experiência permite perceber, tanto na sua constituição, quanto nesse estar prenhe, nesse existir em devir em si mesmo. Ou seja, ao olharmos o tempo, aquilo que em nossa linguagem chamamos o “nosso tempo”, não o vemos nem em sua extensão temporal na qual nos situamos fragilmente, nem que já não habitamos mais o que vemos, daí tantas contradições das formas de enraizamento – e as rupturas, nesse sentido, são também uma busca exasperada de enraizamento em um tempo em mudança.

Nesse desejo do tempo, na consciência entre passado, presente e futuro, em que escolhemos definindo o que somos em vias do que fomos-seremos, nem sempre desejamos o presente ou contemplamos com expectativa e confiança o futuro para o qual nos sentimos arrastados em um turbilhão de vontades decorrentes de partilharmos tempos e espaços conectados e contraditórios. Nunca compreenderemos bem o tempo (o mundo), sobretudo quanto mais imaginamos compreendê-lo, porque nele somos escravos e apaixonados, e nele temos os olhos embaçados com a nossa brevidade e nosso conhecimento de tudo a partir do que somos.


como citar:
SANDEVILLE JR., Euler. “Breve advertência sobre períodos, e sobre a organização da navegação neste sítio“. A Natureza e o Tempo (o Mundo), on line, São Paulo, 2016.







estudos em história da cultura, das artes e da paisagem:
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